35.º aniversário da libertação de Mandela: não precisamos de super-heróis

– “O mundo dispensa super-heróis, cheios de certezas e superioridade, mas clama por Mandelas, corajosos e inspiradores!” 
– “O mundo não será salvo por super-heróis!” 
– “Claro que não! Os super-heróis não existem!”, dirão imediatamente leitores atentos e indignados. Mas, será que não? Se os super-heróis forem seres que, fazendo uso dos seus super-poderes, parecem predestinados a salvar a humanidade de todos os males, se os superheróis forem figuras extraordinárias, que se interpõem entre a humanidade e a sua extinção, para conduzi-la ao triunfo, então eles existem e estão bem presentes entre nós!

Nos dias que correm, pululam figuras, inspiradas ou não nos heróis da Marvel, cheias de super-poderes, que arrogam superioridade em relação aos da restante espécie. Dotadas de uma “visão avançada”, conseguem indicar caminhos claros por entre uma sociedade maniqueísta, onde só há bons e maus. E estão sempre do lado dos bons! A sua superioridade intelectual conferiu-lhes autoridade para distinguir uns dos outros.

Há exatamente 35 anos, todos os caminhos em torno da prisão de Victor Verster, a pouco mais de 50 kms da Cidade do Cabo, estavam apinhados de gente que se debatia para estar mais perto e mais alto, querendo ver, pela primeira vez, o rosto daquele que o mundo elegera como símbolo da queda de um sistema autoritário e repressivo, do fim de um regime abjeto que separava o bem e o mal segundo a cor da pele.

Entre a multidão que ali se apresentava, muitos estariam à espera de um super-herói, mas o que viram foi um homem comum, que durante 27 anos havia feito uma enorme viagem interior ao encontro da essência do ser humano, descobrindo que o trunfo da humanidade está naquilo que nos une, e nunca naquilo que nos separa. Que viagem incrível pode um homem fazer, sem sair do mesmo sítio!

O que Mandela alcançou, depois de libertado, foi grande demais! Ele foi um verdadeiro escultor da Humanidade, que só entendeu porque a conseguiu ver nos seus inimigos. Liderou um país condenado à eterna retaliação entre fações e fez dele um exemplo para o mundo. Mundo esse que também serviu – e continua a servir – através do testemunho das suas ações, sabendo que o bem e o mal estão no coração de cada ser humano, e que por mais que este alimente o seu lado mau, haverá sempre um vislumbre de humanidade.

Como era difícil a sua missão naquela tarde de 11 de fevereiro de 1990, quando às 16h14 caminhou como um homem livre. Os olhos de um mundo, que já não reconhecia, estavam pousados sobre ele, compreensivelmente céticos mas simultaneamente esperançosos. E ele não dececionou. Com o seu exemplo inspirou até os mais céticos. Numa espiral contagiante de Esperança, foi exímio a servir, a reconciliar e a unir.

Nunca cedeu ao medo e ousou liderar corajosamente, sendo o primeiro a perdoar. “O perdão liberta a alma e remove o medo. Por isso é uma arma tão poderosa!”, dirá.

O mundo dispensa super-heróis, cheios de certezas e superioridade, mas clama por Mandelas, corajosos e inspiradores!

Não podemos todos ser como ele, mas podemos todos aprender com ele.

E talvez possamos salvar o mundo!

Rui Nunes da Silva 
Presidente do Instituto Padre António Vieira